Por Dr. Fernando Pompeu Luccas
– A Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101 de 2005) já foi alvo de muitas críticas. Como o Sr. avalia, é uma lei eficaz considerando a expectativa do empresário ou empreendedor?
Fazendo uma comparação com a legislação anterior, sem dúvida houve um grande avanço. No entanto, sua eficácia esbarra atualmente em aspectos culturais, sob três vertentes: a cultura do empresário brasileiro de não se valer de consultorias especializadas durante o desenvolvimento de suas atividades, procurando especialistas só quando já não há mais muito o que salvar; a visão de alguns empresários de considerarem a alternativa da Recuperação Judicial como uma possibilidade ruim, que trará grande exposição à sociedade empresária e a ele próprio; e, por fim, o desconhecimento de outros tantos empresários sobre a Lei 11.101/2005, desconhecimento esse que também se estende a uma parcela considerável dos advogados, mesmo após 11 anos de vigência do diploma.
Tratam-se de grandes erros, pois essa lei traz o caminho adequado que o empresário deve seguir em situação de crise, tendo como alternativas a recuperação judicial ou extrajudicial, bem como a própria falência, se não preencher os requisitos para pleitear um dos caminhos anteriores, nos termos do artigo 105 da LRF.
Diante disso, o diploma é adequado e precisa ser aplicado. Quando utilizado da forma devida, sem dúvidas traz as ferramentas necessárias para resolver a questão, podendo, portanto, atingir a eficácia esperada.
– Sob o aspecto jurídico, como o Sr. analisa o conteúdo da lei?
Nossa lei tem forte influência da legislação norte-americana e a eficácia do chamado chapter eleven nos EUA é muito maior, por conta dos aspectos culturais que comentamos anteriormente.
Diante disso, minha análise sob o aspecto jurídico é positiva. Claro que existem oportunidades pontuais de aperfeiçoamento (como toda lei), mas não vejo o caminho da mudança substancial como uma boa alternativa. Penso que o melhor caminho realmente é a maior divulgação da lei, para que existam mais profissionais especializados, mais empresários conscientes e uma aplicação menos desvirtuada do instituto, outro problema que costumamos enfrentar na prática.
– E quanto à falência?
Assim como a recuperação, a falência também é uma alternativa que deve ser considerada, bastando a correta avaliação do caso concreto. Se a sociedade empresária, diante da situação de crise em que se encontra, não tem mais viabilidade, o caminho realmente é o da falência.
No entanto, vê-se ainda muitas empresas nesse estado simplesmente encerrando suas atividades de forma irregular, ou tentando se valer da recuperação judicial como alternativa, fazendo com que, nesse segundo caso, aumente ainda mais o índice de recuperações convoladas em falência, por exemplo.
– Considerando o cenário de crise que vem desde o ano passado, com a “quebra” de empresas, houve aumento nas demandas dessa área?
Sim, e a tendência é que aumente cada vez mais. Analisando os números da Serasa, no comparativo “ano contra ano – 2015/2016”, observa-se que o número mais que dobrou.
Penso que o aumento se dará por dois motivos: além da crise, que é o principal deles, vemos agora com mais frequência os principais veículos de comunicação dando cada vez mais enfoque às recuperações. Isso tem tornado a lei cada vez mais conhecida e menos estigmatizada pelos empresários.
Diante disso, vejo um cenário mais favorável em relação à eficácia da lei, principalmente com o aumento de profissionais especializados na matéria.
– A busca por bancas e profissionais especializados em Recuperação Judicial aponta para um crescimento em 2016?
Sem dúvida alguma é essa a tendência. Vejo o reflexo disso, inclusive, no aumento das minhas próprias demandas na área consultiva do escritório, com um acréscimo significativo da procura em 2016, tanto por parte de empresários, quanto por parte de colegas que atuam em áreas relacionadas (mas não têm essa especialização), e acabam sendo procurados por clientes com casos relacionados à matéria, necessitando, então, de suportes pontuais.
Diante desse cenário, vejo uma grande oportunidade para os advogados que se identificam com a matéria e que gostam também de economia e administração, que são áreas correlatas.
Pela Comissão de Estudos em Falência e Recuperação Judicial, promoveremos palestras, debates e cursos sobre o tema, que com certeza ajudarão os advogados interessados na matéria e que desejam começar a trabalhar com o assunto.
– O novo CPC trouxe alguma modificação que impacta sobre a Lei de Recuperação Judicial e Falência?
Sim, principalmente em relação às contagens de prazos processuais, que passam agora a ser em dias úteis. Ainda existe discussão sobre esse ponto específico, principalmente no tocante ao prazo do stay period, que faz com que as ações e execuções em face da Recuperanda sejam suspensas por determinado período, por exemplo.
Outro ponto também de discussão é a possibilidade de recurso de todas as decisões interlocutórias, dado o rol restritivo que o Novo Código de Processo Civil traz em relação ao Agravo de Instrumento.
Não há ainda uma sinalização da jurisprudência a respeito, considerando-se a recente entrada em vigor do NCPC, mas penso que deverá seguir a linha do bom senso, principalmente pelo o fim proposto ao qual se destina o processo de recuperação.
– Em sua opinião, quais são os desafios para os advogados que atuam na área?
Considerando as características dos processos, o mais desafiador e também interessante é o caráter multidisciplinar da área. Além da necessidade de dominar as questões jurídicas sobre o assunto, o advogado que deseja militar nessa área deve também buscar conhecimentos nas esferas econômica e administrativa.
Isso amplia a visão do profissional e penso que só faz agregar. Além dessa questão multidisciplinar, os aspectos jurídicos também são muito interessantes e as discussões muito ricas, o que faz com que o profissional tenha que sempre se manter atualizado e em estudo. As possibilidades e discussões que o tema proporciona são realmente apaixonantes. Para quem gosta de se aplicar, é um prato cheio.
O mais interessante é que o tema trata de um dos aspectos mais importantes da economia do país, que é calcada na atividade empresarial. Sem empresas, não há empregos, não há renda, não há recolhimento de tributos, nem circulação de bens e serviços. Ou seja: não há sustentabilidade econômica. Portanto, o profissional que atua nessa esfera lida com questões que são alicerces da economia, o que torna a matéria ainda mais apaixonante.