Por Fernando Pompeu Luccas
Não é novidade a extrema morosidade da justiça em nosso país. Uns imputam a culpa à falta de estrutura do judiciário, com número de serventuários e juízes muito inferior à demanda; outros, à imensa possibilidade de Recursos previstos; outros, ainda, dizem que a culpa é dos próprios operadores, que “travam” os processos de acordo com seus interesses.
De fato, as três hipóteses (dentre outras) devem ser consideradas, mas a maior vilã é realmente a falta de estrutura, que não atende a demanda.
Em se tratando dos processos de Recuperação Judicial, a realidade não é diferente; no entanto, a Lei 11.101 de 2005 possui características peculiares que a destaca das demais, tendo um facilitador para a celeridade do processo: a existência do que podemos chamar de duas “fases”, no tocante à verificação dos créditos – administrativa e judicial – iniciando-se a partir do processamento da demanda. E é aí que se destaca a importância de outro facilitador particular a essa norma, figura fundamental para o deslinde regular do processo: o Administrador Judicial (que não pode ser confundido com os administradores da empresa), tendo suas funções definidas, em sua maioria, pelo artigo 22 da lei.
Mais do que cumprir todas as funções determinadas na lei, o Administrador Judicial deve, na prática, zelar pelo transcorrer regular do processo, tendo em mente que sua atuação pode e deve facilitar muito a atuação do próprio judiciário na demanda.
Como exemplo, podemos citar questões como a comunicação aos credores e a verificação correta dos créditos.
Quanto à comunicação aos credores (que também ocorre via edital, porém com efetividade prática problemática), o Administrador Judicial estará atuando de acordo com a norma se enviar cartas aos credores, comunicando sobre a existência do processo e as características dos créditos. No entanto, o Administrador não deve se limitar apenas a isso, mas sim deve verificar efetivamente se essa comunicação teve êxito, valendo-se também, se for o caso, de outros meios complementares, como envio de emails, telefonemas, mensagens, internet, enfim, outros meios que garantam que os credores terão efetivamente ciência do processo.
Essa posição pró-ativa do Administrador faz com que o credor efetivamente tome conhecimento da ação logo de partida, evitando que, posteriormente, tenha que se valer de incidentes processuais para a defesa do seu crédito, dando mais trabalho ao juízo. O credor que já conhece de início o processo e como o seu crédito está lançado, pode já em “fase administrativa” discutir a questão, podendo ser resolvida desde logo pelo Administrador.
Apresenta-se aí outro ponto coligado: a prévia discussão acerca das classificações e valores dos créditos, feita no que chamamos de “fase administrativa”. Dá-se esse nome, pois, nesse primeiro momento, não há participação do juízo nessa discussão, cabendo ao Administrador Judicial a verificação da realidade dos créditos, tomando por base as informações da Recuperanda, comparadas às eventuais Divergências e Habilitações apresentadas pelos credores.
Nesse ponto, bem como em todos os demais, cabe ao Administrador Judicial atuar com total imparcialidade, tirando também suas próprias dúvidas que venham a surgir em relação aos créditos apresentados e discutidos, entrando em contato eventualmente com devedora e credores, visando saná-las ainda em “fase administrativa”.
Não deve ele lançar eventual crédito duvidoso em segundo edital para que a pendência se resolva em “fase judicial”, quando pode previamente resolver a questão; resolvendo a situação de antemão, evitará nova discussão em juízo, facilitando o deslinde da demanda, reduzindo o número de incidentes. Deve o Administrador Judicial “entregar” o trabalho de verificação de créditos da maneira mais organizada, mais “redonda” possível, para o juízo; claro, quando isso for efetivamente possível.
Tal atuação se mostra de suma importância, inclusive, considerando também que as Assembléias de Credores, quase que em sua maioria, ocorrem antes do julgamento das Impugnações/Habilitações da “fase judicial”, o que reflete diretamente na não realidade exata dos percentuais de cada crédito nas contagens de votos.
Existem outros vários exemplos de como a atuação do Administrador Judicial é fundamental para o regular desfecho da demanda, como auxílio do juízo na fiscalização do cumprimento dos prazos e obrigações das partes envolvidas, o levantamento completo de todas as informações pertinentes, a atuação como presidente da Assembléia de Credores, que é um dos mais importantes e cruciais momentos do processo, etc.
O fato é que o Administrador Judicial deve ter em mente que o seu trabalho deve se desenvolver da melhor maneira possível, e que esse desenvolvimento de excelência está intimamente ligado ao sucesso do transcurso da demanda.
Verifica-se atualmente, em ambientes de trabalho e acadêmicos, que um número crescente de Administradores Judiciais vem buscando total especialização e auto-estruturação, valendo-se também, cada vez mais, da tecnologia para desenvolvimento do trabalho em nível de excelência, como o uso de websites trazendo todas as informações do processo, a participação em cursos de especialização específicos para a área, o comparecimento em palestras sobre o tema, etc.
É isso que efetivamente se espera. Afinal, quando se trabalha com uma lei que dá essa oportunidade de se resolver questões pontuais previamente em “âmbito administrativo”, desonerando um pouco a sobrecarregada estrutura judicial, há que se aproveitar tal possibilidade, visando dar celeridade e melhor organização ao processo como um todo.